Contudo, convém começar por uma referência de distanciamento, por exemplo num autor clássico- Virgílio. «Este menino» que verá surgir a idade de ouro, « ao Céu erguido e governando a Terra / em paz». Com o advento do Cristianismo esta passagem da 4ª Écloga, tornou-se nos meios proto-cristãos uma profecia.
Referências de esperança por contraste com a desesperança (a unhope ) estão nas Literaturas até hoje. Jean-Paul Sartre descreve isto muito bem. Intui o mistério cristão, o início ligado ao nascimento de um menino. “Um Deus-Homem, um Deus feito da nossa carne humilde, um Deus que aceitaria conhecer este gosto de sal que existe no fundo das nossas bocas quando o mundo inteiro nos abandona.» Sabe-se que Sartre jamais escreveu assim acerca de Deus. (Peça de teatro “Barjonas, ou o filho do trovão”, um Auto de Natal de 1940 .)
Não obstante as causas pagãs que levaram à criação de Alberto Caeiro terem sido «a pura e inesperada inspiração», sem nenhum intuito bucólico, apesar do panteísmo por princípio, o facto é que o «Menino Jesus», «a Eterna Criança», «a Criança Nova », impressionaram o poeta Fernando Pessoa num certo sentido iconoclasta e anti-clerical.
Houve, depois, José Régio que, sendo crítico irreversível do filósofo Nietzche pelas suas afirmações sobre Jesus, disse que só o grotesco e gigantesco ciúme daquele «poderia querer ver neste Jesus (Jesus Nazareno) um Deus de escravos. Jesus é, pelo contrário, um Deus de heróis.» Finalmente, sem nenhuma tónica pessimista, os poetas Jorge Luís Borges e Miguel de Unamuno marcam a fronteira do perdão em Cristo, na Cruz: «Cristo na cruz. Os pés tocam na terra. / Deixou-nos esplêndidas metáforas / e uma doutrina do perdão que pode / anular o passado.» ou na afirmação de Unamuno, «Que eres, Cristo, el único / Hombre que sucumbió de pleno grado, / triunfador de la muerte»
(Texto publicado em moldura na revista Novas de Alegria)
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