Monday, May 17, 2010

Nota para um perito chamado padre Ratzinger

Fé e Cultura é, sem dúvida, uma communio ( comunhão) para Joseph Ratzinger.
Não é pois por mera necessidade de usar o seu nome que a revista “Communio” o teve como colaborador no seguimento lógico dos documentos do Concílio Vaticano II.
Ratzinger vem de uma tradição, como perito do Concílio aberto por João XXIII, de agitar as águas e colocar questões difíceis de digerir pela Hierarquia.
A escassos mêses da sua eleição, o futuro Papa Bento XVI dá uma entrevista ao diário italiano La Repubblica, e afirma o que os Evangélicos há muito denunciam, que «Deus está marginalizado, na vida política parece quase indecente falar de Deus. (...) Uma sociedade em que Deus está totalmente ausente se auto-destrói».
Deixou a sua marca de teólogo inconformista durante o próprio Concílio em várias matérias que hoje levariam o título de fracturantes. A questão da não obrigação do celibato.

O mês era o de Outubro de 1963 e discutia-se «casamento ou celibato dos diáconos?»
Tratava-se, sobretudo, de a Igreja Católica Romana restaurar a função do diácono na pastoral, podendo o mesmo substituir por ausência os sacerdotes em certos sacramentos como assistir a casamentos, ensinar, presidir à oração, etc, e não apenas na distribuição da eucaristia. Havia o exemplo da Igreja do Oriente já possuir diáconos e padres casados, desde a sua origem.
O Cardeal Ottaviani, que viria a ser primeiro Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, dirigia os trabalhos com mão férrea já disposta para o renovar da Inquisição com outro nome mas idêntica substância, adaptada aos tempos modernos, acolheu contudo todas as posições, mesmo as que reclamavam a possibilidade de os diáconos deverem ou não ser «ligados pela lei do celibato».

No fim do debate, diz a história (1), ainda que «por caminhos ínvios» à propositura aduzida às discussões conciliares, veio perguntar se «antes que restabelecer um diaconato permanente, não seria melhor conferir a certos homens casados a ordem menor do acolitado», podendo de facto «administrar certos sacramentos unicamente em caso de necessidade e na ausência de padres».
Estava assim desmontada em 30 de Outubro a proposta «revolucionária» de certos peritos teólogos, três apenas no entanto, que fizeram circular textos entre os bispos pedindo-lhes para votarem a «favor de um diaconato sem obrigação do celibato».
O Cardeal Ottaviani afirmou, na circunstâcia, que«os bispos não devem depender dos peritos nessa matéria e estes últimos saíram fora da sua missão». (2)

Todos se perguntaram quem eram os três peritos visados pelo Cardeal. Os textos traziam as assinaturas dos mesmos, sendo dois deles mais tarde reconhecidos como grandes teólogos da Igreja Católica Romana: Karl Rahner e Joseph Ratzinger, o último poderoso Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé.

Naquele início da década de 60, Ratzinger propugnava, como padre conciliar, perito e consultor teológico no Concílio, por algumas reformas. A colegialidade dos bispos, o envolvimento positivo de todos, hierárquia, institutos missionários e fiéis, nas Missões, e até o tal princípio do Não ao celibato obrigatório dos padres. Todavia um artigo no Paris-Match de 5-11-1963 reproduzia sensacionalmente as palavras de um bispo francês: «Padres casados, no Ocidente, é assunto para o Concílio Vaticano III»
(1) A Igreja do Presente e do Futuro- História do Concílio Vaticano II, 3 Volumes
(2)Ibidem, Vol. 1, págs 296/300


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