Saturday, June 24, 2006

Memórias aos 59

When I look back, I see a collapsing
accordion of my receding houses
Robert Lowell


Quando olho para trás, vejo o colapso
da minha infância, a derrocada
dos meus calções de golfe
e camisas aos quadrados,
ao mesmo tempo que o das casas
e dos quartos e das janelas
em que debrucei os meus
primeiros, inocentes olhos
e assim a sucessão
das ruas em lisboa
quando olho para trás
vejo meus pais
a quererem talvez mover-se
para o futuro.

Tuesday, June 13, 2006

Sófocles ou o Equívoco do Destino

Mergulhar na problemática das origens do homem, se por um lado é rebuscar o inocente, que a Bíblia revela antes da Queda, é, por outro, o confronto com a realidade do livre arbítrio, a liberdade da criatura humana poder escolher entre o Bem e o Mal.
Já o mergulho na mesma problemática nas obras trágicas de Sófocles- sobretudo no triângulo Sófocles-Édipo-Antígona - é, sem dúvida, o mergulho nas origens mitológicas do destino, que, segundo o autor grego, traça a vida do homem dominado pelos deuses, sem esperança.
O herói trágico grego tem que enfrentar um poder mítico sediado nos deuses, numa ideia de ética elevada sem redenção, o que é contrário à Graça de Deus revelada na Bíblia Sagrada e na Teologia Cristã.
Sófocles traça esse roteiro da desesperança, embora repleto de moralidade natural e lições de vida e de justiça, em quase todas as suas peças que chegaram até aos nossos dias.
As tragédias mais conhecidas e que continuam a impressionar a cultura ocidental, a arte e a estética dramáticas, a filosofia e, sobretudo, a ciência psicanalítica, são indubitavelmente Édipo Rei, Antígona e Electra.
Qualquer um destes monumentos da Literatura do Mundo, milenar e intemporal, da Antiguidade Clássica, traduzem aquela que era a visão de Sófocles, isto é, que o homem era um joguete nas mãos dos deuses, que o destino traçado lançava os homens, amarga e demolidoramente, na vida, sem possibilidades de perdão.
Por exemplo, o conceito ateniense, sófocliano, de destino personificado, fortuna , sina , num vocábulo grego moira, são disposições fatídicas, são alguma coisa assim como o determinismo, que somente poderiam ter lugar no mundo helénico.
Como sabemos, a Palavra de Deus não usa, conceptual e religiosamente, o termo Destino. Todavia quando utiliza, nas nossas versões, os termos Destino e, até, Fortuna ( Isaías,65,11), carrega os mesmos com a tonalidade das cores negra e cinzenta dos ídolos (os deuses Gade e Meni, sírios ), com os quais não pode haver comunhão, a tal ponto que a versão do Velho Testamento para a língua grega, a Septuaginta, lhes chama daímoni (demónio ou espírito do mal).
No entanto utiliza o verbo destinar ( fazer algo em favor de ), que tem a ver com a soberana vontade divina e, no mesmo plano, com a misericórdia e amor de Deus. O Apóstolo fundador da cultura cristã ocidental, escreveu aos tessalonicenses que Deus não nos destinou para a ira, mas para alcançar a salvação mediante Jesus Cristo (I, 5,9),apesar da culpa. Esta asserção é universal, embora esteja aplicada em primeira mão aos crentes.
Em caso nenhum classicamente conhecido, nas tragédias de Édipo Rei ou de Antígona , para apenas citar estas duas obras-primas, a culpa tem redenção.
O modelo deveria ser assim, o próprio Aristóteles vê na primeira peça o seu ideal, isto é, o trânsito da felicidade para a infelicidade, o terminar no infortúnio, jamais o contrário, pelo menos conforme as suas regras estabelecidas em Poética .
O erro humano nos trágicos gregos, chamado hamartia, ( como também mais tarde no Novo Testamento) pagava-se caro e não tinha possibilidades nem de remissão nem de deixar de ser cometido nas acções iníquas, à luz da moral e das leis da Cidade. Édipo declara «os deuses detestam-me » e este é o tom do seu infortúnio, a razão de ser dos seus males predestinados.
«Que tempestade de terríveis desgraças derrubou o Édipo », declama o Coro, ao contrário do que se passa noutra tragédia, Antígona, do mesmo dramaturgo grego.
Nesta, a heroína Antígona sem vatícinio fatídico traçado à priori , quando se vê confrontada com a fatalidade, com o destino, revolta-se contra os desígnios, mais dos homens que dos deuses. Seja como for, Antígona enfrenta o destino; Édipo é apanhado no meio do turbilhão dos seus equívocos. Antígona arrisca revoltar-se - «Queres ficar do meu lado? Queres arriscar comigo? »- pergunta à sua irmã Isménia. Arriscar contra o quê? O destino escrito de que se desse sepultura condigna - dir-se-ia pré-cristã - ao seu irmão Polinices, estaria a desobedecer às leis do tirano Creonte e seria condenada à morte por tal acção de amor.
Seja como for, os dramas gregos retratavam o ser humano a meio caminho entre os fios que moviam como que uma marioneta, manobrada pelos deuses no seu presente, e o destino traçado pelos oráculos no passado. O protagonista humano, ou mesmo semi-deus, nas tragédias gregas, não tinham genericamente meio de se libertar.
Deuses, semi-deuses, humanos, não resolviam na tragédia grega nenhuma pendência entre si, que não fosse estruturada nas palavras e na vontade do oráculo, fosse numa realidade histórica remota - Édipo já vinha da ficção homérica-, que por sua vez já derivava da mitologia, fosse na metaforização do religioso.
Os seres humanos da maior parte das tragédias dos autores atenienses do Século V a.C, não poderiam renunciar a nada que estivesse lavrado nos autos do predeterminismo. A sua relação com o divino, era a relação com um deus-ex machina, com os numes de quem todos os acontecimentos dependiam. O equívoco e a desesperança faziam parte desta relação. Não obstante o valor do homem aos «olhos » das divindades ser evidente, o ser humano sofria, segundo o pensamento trágico dos gregos, de uma impossibildade congénita de encontrar a salvação, de vencer o mal, retratado na figura do Hades.

Friday, June 02, 2006

A Lei da Gravidade

Nascemos aqui
é esta
a nossa casa

somos a prova
que contraria Newton
a lei

da gravidade,voamos
dentro das cores
dos nossos olhos

pequenos, pomos
no coração
grandes coisas

gravitando no sangue
um amor, um peso
as lágrimas

caímos com a noite.

13-05-2006

Thursday, June 01, 2006

O percurso histórico da Bíblia Sagrada

A Bíblia na Cultura Portuguesa

Em Outubro de 1835 a Sociedade Bíblica de Londres envia a Lisboa George Borrow com o propósito de difundir a Bíblia em Portugal. Sabe-se pouco sobre esta estadia, conhece-se no entanto a finalidade da mesma, a divulgação da Bíblia desde a perspectiva cristã evangélica. Infelizmente muito pouco as autoridades de então deixaram fazer, razão pela qual o enviado da Sociedade Bíblica Britânica e autor da obra The Bible in Spain, de 1842, rumou para a dita Espanha a fim de distribuir as Sagradas Escrituras.
Assim, a primeira ideia que nos ocorre é a de que a relevância da Bíblia na história e na cultura portuguesas, se prima por alguma coisa é pela ausência. Apesar de um século e meio pelo menos de esforços evangélicos e de Sociedades Bíblicas. Tomando mesmo em linha de conta iniciativas extraordinárias, de grandíssimo alcance social e religioso, como a Bíblia Manuscrita que transversalmente passou em 2004 por todo o país e que o Ministério da Cultura considerou de «superior interesse cultural».
Contudo, a investigação das Escrituras Sagradas, de uma forma definitiva designadas por Bíblia Sagrada, Velho e Novo Testamento, foi, é e continuará a ser a melhor influência para tradições artísticas, filosóficas, históricas e da própria narrativa literária de qualquer nação.
Neste campo, os próprios estudos de dialogia de Mikhail Bakthin, por exemplo, são matéria de referência, sobretudo quando aquele teórico linguista e filósofo da linguagem russo escreve sobre a polifonia das falas das personagens, autonómas mas relacionadas umas com as outras, no mesmo texto, ou sobre a polifonia de um texto em diálogo com outros textos. Digamos que existe polifonia há séculos em inúmeros relatos bíblicos do VT (vd. o que poderemos considerar um paradigma nos textos II Samuel 12 e Salmo 51) e dos próprios Evangelhos em que há, por assim dizer, uma verdadeira sinfonia polifónica, na qual o seu Autor, o Espírito Santo, respeitando as personalidades de cada autor sagrado, a sua cultura, a sua geografia local, até as suas contextualizações sociais e políticas, inspira, revela e age em tudo o que concerne ao Homem, porque este é o único alvo e receptor da Palavra Divina.
É usual afirmar-se que as duas grandes fontes do conhecimento moderno do mundo e da humanidade se encontram nos velhos campos da Grécia e de Roma, apesar de Fernando Pessoa afirmar sempre que a transição cultural da Grécia para Roma se tenha exercido por meio da decadência. Seja como for, acrescenta-se normalmente que o mundo judaico-cristão, que as desafiou e absorveu, também bebeu dessas fontes.
E a provar esse entendimento, é costume falar-se em figuras fundadoras e com obra fundacional como Homero, Sófocles, S.Paulo ou Dante, entre outras.
Há, porém, um Livro que contém Civilização, que aborda as Ciências Naturais, as Geografias, a Zoologia, a Biologia, que fala do Ritual religioso, do Heroísmo, das Epicidades, da Poética, que aborda até a Filologia, que esclarece sobre Humanidades e que revela a Divindade, afinal as origens da fundação de tudo. É incontestável o nome desse Livro, Bíblia Sagrada, que na diversidade unívoca dos seus 66 livros é a Palavra de Deus, traduzida para as nossas línguas modernas e vivas por Lutero na Alemanha ou por Wycliffe e William Tyndale e autorizada pelo Rei Jaime, na Inglaterra, ou traduzida por J.N.Darby ou Louis Segond, na França, Casiodoro de Reina e Cipriano de Valera, em Espanha, ou por João Ferreira de Almeida em Portugal.
Um exemplo como simples indicador, embora a sua importância seja incontornável, está no facto da Bíblia constar no currículo do Departamento de Literatura do conceituado MIT (Massachusets Institute of Technology). Há também notícias científicas de que constou como cátedra importante na nossa Universidade de Coimbra.
Este texto pode ser lido na íntegra em: www.portalevangelico.pt